22/12/2003

Momentos do ano

É a primeira vez que faço isto e ainda não sei bem por onde começar... O que me foi proposto foi escolher os meus 10 discos do ano. Confesso que este foi talvez o ano em que poucos discos lançados este ano comprei, infelizmente o mercado está bastante inflacionado e, cada vez mais, temos de olhar para as etiquetas "Preço Verde" e "Preço de Amigo", que normalmente rondam o preço aceitável por um disco (entre 12 a 16 euros). Com os preços praticados e com a falta de emprego (limito-me a estudar em horário quase-pós-laboral), esta selecção fica bastante dificultada.
Achei, contudo, que não devia referir apenas discos do ano mas também momentos...

O momento extremamente negativo de 2003 foi a não-existência do festival Ilha do Ermal. Se por um lado um dos momentos mais negativos de 2002 foi a forma como o público reagiu aos Nickelback, por outro lado é importante e faz falta um espaço onde o Nu-Rock e outros sons mais "pesados" tenham um lugar de destaque. O meio underground do metal é, talvez, aquele que tem maiores dimensões em Portugal e a existência de um festival que faça uma maior aproximação a esse público é totalmente justificado e louvável.
Também extremamente negativa foi toda a polémica em torno da Orquestra Metropolitana de Lisboa, da qual gosto particularmente. Não tenho dúvidas que, uma vez reposta a credibilidade da instituição, esta continuará a ser a maior e melhor Orquestra portuguesa, seja com que maestro fôr.
Em termos de rádio foram globalmente negativas as (novas) mudanças radicais no seio do grupo Media Capital Rádio (MCR), que voltou a trocar as voltas aos ouvintes. Nestas mudanças apenas o público mais novo de Porto, Coimbra e Lisboa é que fica contemplado com o canal dirigido a eles (a Best Rock, à semelhança do que acontece com o canal rebelde do grupo Renascença, maior rival do MCR); recriou o enfadonho Rádio Clube Português (que, apesar de ter sido o canal que deu origem à revolução de Abril, foi até essa madrugada uma rádio ao serviço do regime) mas que em pouco difere da antiga Nostalgia, apesar de ser dita generalista; a Comercial que foi totalmente reformulada para um público que quer ouvir quase exclusivamente hits, à semelhança do que acontece com a RFM (novamente grupo Renascença); para finalizar também a intermitente emissão da Mix FM no Porto é alvo de crítica. O grupo MCR parece estar inconsistente e, a meu ver, limita-se a tentar seguir o rasto do grupo Renascença. Um tão elevado número de mudanças num período tão escasso não me parece boa política para manter e cativar ouvintes.
Fora do âmbito musical e também pela negativa fica o fim dos ciclos de cinema alternativo no Cine-Estúdio 222, também em Lisboa.

2003 foi também um ano de momentos muito positivos e que desejo que se voltem a registar em 2004. Seguindo a mesma ordem de temas que abordei acima, em termos de festivais foi extremamente positiva a forma como as novas bandas portuguesas passaram pelos palcos dos grandes festivais, contrariando os responsáveis dos grupos privados de rádio que dizem que as pessoas não querem ouvir nova música portuguesa e daí não investirem nela. Vejamos o caso dos EZ Special, por exemplo, uma nova banda e, a partir do momento em que cativaram os ouvidos dos responsáveis de marketing de um operador de telecomunicações, passaram a ter grande air-play em rádios que, por norma, fecham as portas a novos projectos. Mas falava eu dos festivais... O efeito não é propriamente surpreendente, tem vindo a crescer lentamente ao longo dos anos, e consiste na forma como as pessoas vêem as bandas nacionais. Se há três/quatro anos atrás um palco secundário estava sujeito a ter meia-dúzia de curiosos e amigos das bandas a observá-los, agora as pessoas já fazem uma certa questão em passar por lá com a curiosidade de conhecer. Este fenómeno registou-se particularmente na tarde de hip-hop do Festival Sudoeste, onde várias centenas de pessoas se apertavam dentro da tenda.
As Orquestras do Porto vão finalmente ter um espaço (ou já têm) decente para as suas actividades na tão polémica e atrasada Casa da Música. Finalmente alguma coisa em defesa dos músicos clássicos do Porto! Há já vários anos que eram pedidas instalações à Câmara Municipal mas esta nunca deu relevo à cultura. É um facto que o Porto tem problemas bem mais graves que precisam de ser solucionados mas também não se justifica que decisões de clubes de futebol já sejam tidas em conta e com prioridade para executivo camarário.
Na área das rádios foi o serviço público de rádio-difusão que esteve melhor. RDP Antena 1 com um leque mais alargado de nomes portugueses, programação mais abrangente e uma imagem mais jovem e, ao mesmo tempo, mais portuguesa. RDP Antena 2, até aqui limitada a composições clássicas e óperas, expandiu-se também à área do jazz (até aqui quase confinado aos "Cinco Minutos de Jazz" de José Duarte, no canal generalista da RDP). RDP Antena 3, mantendo a base estrutural herdada do Eng. Luís Montez, voltou a crescer na área dos programas temáticos e de autor.

Dito isto, vamos a discos... É habitual escolherem-se múltiplos de 5. Para não correr o risco de excluir algum disco que me agradasse nem escolher discos que não me marcaram particularmente, resolvi escolher meia-dúzia de discos que me surpreenderam de alguma forma.

Alla Polacca & StowawaysStowaways - "Why not you?" (Bor Land)
A Bor Land tem trazido para o panorama musical novos nomes e estilos. Se até Janeiro de 2003 a etiqueta de Rodrigo Cardoso contava apenas com compilações e um Split CD promocional, logo no primeiro mês deste ano lançou o trabalho de Old Jerusalem e fechou o ano com um duplo CD de Alla Polacca e Stowaways. Qualquer um dos discos poderia constar nesta lista mas foi a sonoridade dos Stowaways que me cativou e surpreendeu mais; por um lado fez-me reviver os meus primeiros anos de vida, os desenhos animados musicais e, por outro lado, abre portas para a (re)criação de estilos.
Blind ZeroBlind Zero - "A way to bleed your lover" (Universal Music)
Não é o meu trabalho preferido dos Blind Zero mas é um disco que deve fazer parte das prateleiras de quem procura os melhores trabalhos de música portuguesa, quanto mais não seja pelo simples facto de ser possível ouvir Jorge Palma a cantar em inglês naquele que considero ser o melhor tema do disco. As histórias em torno dos temas acabam por ser a maior mais-valia deste disco.
ToranjaToranja - "Esquissos" (Universal Music)
Lamentavelmente das poucas vezes em que vi os Toranja ao vivo, o som foi sempre de qualidade medíocre. O que me fez escolher este disco foi talvez a simplicidade das músicas. Não procuram fazer nada de novo e, ao mesmo tempo, são novidade. As músicas ficam agarradas ao ouvido como um cão agarrado a um osso. Se ao início não dei grande relevo à banda, comecei a pensar duas vezes quando dava por mim no chuveiro a cantarolar as músicas deles. Depois da passagem pelo Viva a Música, decidi que era definitivamente um disco a colocar entre os melhores do ano.
INFAMOUS & VRZINFAMOUS & VRZ - "100 Insultos" (Matarroa)
Este disco da editora-irmã da Bor Land (partilham as mesmas instalações da Sra. da Hora - Matosinhos) começou por causar impacto visual. A capa na foto aparenta um cinza escuro e preto banalíssimo mas o real é praticamente todo preto e as partes que se vêem a preto na imagem daqui têm uma camada plástica que reflecte a luz. Depois da apreciação estética o disco foi colocado no leitor de CDs.
O disco é um disco de hip-hop como muitos outros... São 18 temas sempre em torno do mesmo tipo de música e de vozes, o que não é de todo funcional. Ouvindo em blocos de 3 temas já resulta extremamente bem. Bons samples, uma produção de grande nível e convidados que dão a este disco um toque de elevada qualidade no hip-hop português.
Outros discos de hip-hop lançados este ano poderiam estar aqui mas este foi o que causou maior efeito surpresa, daí estar este e não Ace ou os Dealema neste lugar.
Big Fat MammaBig Fat Mamma - "Parece difícil" (Universal Music)
E esteve mesmo difícil para os Big Fat Mamma... Infelizmente nem o disco veio facilitar as coisas, com a banda a passar quase despercebida para a maioria das pessoas e a própria editora pouco ou nada fez para que as coisas pudessem ser diferentes. Este rock com sabor brasileiro merecia melhor sorte, quanto mais não seja pelo rigor com que os músicos fizeram o seu trabalho e pelas mais-valias trazidas pelos convidados.
Sérgio GodinhoSérgio Godinho - "O irmão do meio" (EMI - Valentim de Carvalho)
Não é um disco original no que concerne ao alinhamento mas estão aqui reunidos 15 dos melhores temas de sempre da carreira de Sérgio Godinho cantados ao lado de pessoas de realidades musicais diversas, onde Godinho e convidado(s) de cada tema dão uma roupagem diferente às canções. Vale a pena ouvir e comparar com os originais.


Opiniões e comentários aguardam-se.

Um Natal Sonoro para todos!

20/12/2003

Melhores de 2003

Estamos-nos a aproximar a passos largos do fim de ano e decidimos fazer algo que todas as publicações estão a fazer... Os Melhores do Ano !

Elaborei uma lista, sem qualquer ordem, dos 12 álbuns de 2003 que me marcaram. Deixo a sugestão para fazerem a vossa... e quem sabe juntar concertos, singles, telediscos... o que quiserem...

Aqui vai...

TOP 12 de Melhores Álbuns Nacionais de 2003

Mesa "Mesa"

Stowaways "Why Not You?"

David Fonseca "Sing Me Something New"

Ace "IntensaMENTE"

Toranja "Esquissos"

Old Jerusalem "April"


Spaceboys "Sonic Fiction"

Dealema "Dealema"

Legendary Tiger Man "Fuck Christmas, I Got The Blues"

Mecanosphere "Mecanosphere"

Balla "Le Jeu"

Mundo Complexo "Acredites ou Não


p.s. sim... eu sei... cada dia acrescento um disco... :)

19/12/2003

Doces Mars

Os Mars Volta actuaram há coisa de duas semanas no Paradise Garage, em Lisboa, e o Sonoro foi lá espreitar.

Para quem não conhece estes meninos eles são metade dos desaparecidos At The Drive-In, que editaram em 2001 um dos discos mais aclamados pela crítica (e correctamente!).

Cedric e Omar são de El Paso (onde se passam quase todos os filmes de Robert Rodriguez e também alguns de Quentin Tarantino) e são americanos amestiçados. E talvez seja por isso a fusão musical em cima do palco.

Se de rock podemos falar também podemos juntar os adjectivos de: psicadélico, atmosférico, alucinante, demente e sombrio.

Se já me tinha despertado a curiosidade com "Concertina" (retirado do EP de estreia), o primeiro álbum foi surpresa. Mas... acho que ainda existe um futuro mais arrojado para estes moços.

Recomenda-se:


De-Loused in the Comatorium

06/12/2003

Noites frias, registus quentes

Texto: Manuel Silva
Fotografias: André Garcia (Porto), Inês Póvoa (Lisboa)


 Espaço Registus
Registus - Matosinhos
Alla Polacca e Stowaways apresentaram finalmente o disco que já há um ano planeavam em duas noites frias de finais de Novembro. A Ponte Sonora deu plena atenção ao disco, à apresentação, às bandas e à editora, tendo para tal mobilizado uma equipa no Porto e uma repórter e fotógrafa para Lisboa.

Animação e Movimento

A noite de 28 para 29 de Novembro, no Porto, não era convidativa para grandes incursões pela noite contudo o Espaço Registus – Café Cultural, longe de estar sobrelotado, estava bastante composto. Os Stowaways foram os primeiros a entrar em cena; a tendência é escrever “subir ao palco” mas este foi um concerto bastante intimista, sem palco e com pessoas sentadas no chão (primeiras filas). Não havia nada a provar, a audiência parecia já estar totalmente rendida ao som dos Stowaways e, como se veio a confirmar posteriormente, ao som dos Alla Polacca.

 Stowaways no Santiago Alquimista
Stowaways no Santiago Alquimista
No caso dos Stowaways, os temas revelam uma objectiva ligação a movimento e animação (no sentido de existirem aspectos presentes que nos fazem recordar sons de desenhos animados, sobretudo mais antigos). Possivelmente esta associação deve-se ao facto de, ao lado da área de actuação, estarem a ser projectadas imagens onde se viam desenhos (desde esquemas eléctricos a personalidades ilustres), fotografias com características que revelam décadas de existência e outras fotografias recentes mas com uma vertente algo kitche.

Nesta actuação, os Stowaways recorreram a um teclista exterior ao grupo – Fred – para reproduzir de uma forma mais fiel o som registado no disco, onde a banda contou com as mãos de Elísio Donas (Grace).

A viagem cósmica pela ambiência dos Alla Polacca

 Alla Polacca no Santiago Alquimista
Alla Polacca no Santiago Alquimista
Os Alla Polacca não são uma banda de um só estilo. Já ouvimos diversos temas desta banda, já vimos um número razoável de concertos e questionamo-nos sempre o que estará para vir a seguir. A única característica comum é o facto de ser criado sempre um ambiente em torno dos temas que estimula o lado subjectivo de cada um.
Depois de uma mudança de equipamentos algo demorada, Pedro senta-se aos teclados e faz uma introdução que, conjugada com o vídeo projectado, nos poderia encaminhar para o EP “Not the White P?”, já aqui mencionado por Gonçalo Castro. O vídeo começou precisamente com a imagem de capa do EP, entretanto os restantes elementos vão entrando em cena e a actuação passa a ter contornos bastante diferentes do que inicialmente se previa. Temas fortes em termos de guitarras, revelando um lado mais “rock” (não literalmente) fizeram a essência da performance, depois de já terem passado por lados mais vocais e pelas incursões a teclados noutros concertos.
O fascínio pela experimentação e descoberta de novos sons tem valido à banda uma forte receptividade por parte da crítica e de um público que, de um modo geral, está algo saturado da música “da indústria”. Esta passagem por uma vertente mais “ruidosa” (a prova que o ruído pode ser processado musicalmente e tornar-se interessante) merece a maior atenção e apenas peca pela morosidade de alguns temas (o que, por outro lado, é benéfico para as projecções).

Segredos revelados

No final da actuação do Porto estivamos à conversa com dois elementos dos Stowaways e com Rodrigo Cardoso, em representação da Bor-Land e dos Alla Polacca.

É preciso um sindicato dos músicos

 Stowaways no Registus
Stowaways no Registus
A nossa primeira conversa foi com os Stowaways, seguem-se os melhores momentos da conversa que contou com uma interrupção devido à descarga das baterias do gravador.

  1. O facto de terem tido um tema tão rodado nos últimos tempos, sobretudo na RDP Antena 3, criou-vos alguma responsabilidade adicional ou abstrairam-se desse “sucesso” durante a gravação do disco agora lançado?
    • João Trindade (J.T.): O Amputated Leg não representa claramente o que nós fazemos, ou só o que nós fazemos. Nós fazemos um conjunto de canções, obviamente que tenham a ver umas com as outras...
    • Nuno Sousa (N.S.): Mas nós nem reparamos que o Amputated Leg foi... Reparamos que passou na rádio, se calhar por ser uma música mais mexida...

  2. Porquê esta opção de fazerem o CD “a meias” com os Alla Polacca?
    • N.S.: Foi opção das duas bandas. Foi falado há muito tempo, ainda antes deles terem ido também ao Termómetro. Inicialmente pensámos escrever coisas em conjunto, fazer um CD único com as duas bandas... Entretanto eles ganharam o Termómetro e nós propusemos ao Alvim que em vez de termos os prémios separados, se juntassem os prémios e fizémos o CD.
    • J.T.: No princípio seriam EPs individuais das bandas mas acabou por evoluir para um disco.

  3. E já que estamos a falar de disco, como é que foi trabalhar com o Mário Barreiros?
    • N.S.: Trabalhamos pouco com ele, as duas músicas que gravámos com ele foram gravadas cada uma num dia, foi trabalho de rapidez. Mas foi bom porque é uma pessoa que sabe muito mais que nós, puxa pelas pessoas e prima pelo rigor. Nós podemos ter vontade de ter esse rigor mas não sabemos como se faz e essas coisas vão-se aprendendo.

  4. Temos estado para aqui a falar mas ainda não vos ouvi a classificarem-se em termos musicais. Notam-se algumas influências no vosso som, desde Bossa Nova até à Valsa há de tudo um pouco. O que é que vocês ouvem?
    • N.S.: Se conheceres o reportório que os Alla Polacca ouvem, acabas por encontrar uma série de semelhanças com o que nós ouvimos. É uma mistura de discos dos pais, dos irmãos mais velhos, daquelas séries de televisão e da música que nos chegava pelos dois canais e pelas rádios e acabámos por ter muito presente isso. Nós tentámos manter as coisas coesas mas somos bombardeados de todo o lado de coisas e esse bombardear acaba por fazer parte da cultura comum que conhecemos. Estamos a tentar incutir uma personalidade à música que fazemos.

  5. Mas há essa preocupação de, cada vez mais, convergir para um estilo?
    • N.S.: Não é para um estilo, até porque nós nem pensamos na música em termos de estilo. Pensamos em termos de canções. Se calhar daqui a um ano não vamos gostar das canções que estamos a tocar agora. Até decidirmos que músicas iam para o disco, foi complicado.
    • J.T.: Eu acho que vamos sempre gostar das músicas. Agora daqui a um ano as coisas podem evoluir para um outro lado e poderão fazer outro sentido que agora não faz para nós.

  6. Quais são as vossas perspectivas... Ouvi o rumor que para o ano esperam apresentar um disco apenas “Stowaways”...
    • N.S.: Estas músicas pertencem a uma fase da banda, e ficou conotada como fase porque fizémos disto um disco, e gostávamos de ter incluído mais seis temas nesta gravação e não conseguimos. Gostávamos de ter lançado um disco agora... Se calhar para o ano já temos interesse em lançar outra coisa. Neste momento é mais importante para nós o gravar e o editar do que tocar ao vivo. Nós queremos lançar um álbum, vamos ver as possibilidades.

  7. E passar pelos palcos dos festivais?
    • J.T.: Não é uma prioridade, mas era bom. Justifica-se apenas se quiserem a nossa presença lá. Agora se for para ir lá para ser vaiado, não vale a pena. Nós estamos interessados em ir mas tem de haver algum feedback por parte do público.
    • N.S.: Nós fizémos a tournée da Optimus e alguns sítios foram óptimos para tocar e noutros foi terrível. Parecia que estávamos a obrigar as pessoas a ver. Agora com um disco as coisas já fazem muito mais sentido, as pessoas já conhecem.

  8. Há sempre aquele estigma de que não há locais para a música portuguesa, vocês concordam com isso?
    • N.S.: Da parte dos músicos há muita boa-vontade, há inclusive muitos locais e muita gente que tem vontade de fazer as coisas mas, infelizmente, nós e os Alla Polacca, apesar de termos uma história tão curta, já passamos por coisas terríveis que nós nunca pensámos que poderiam acontecer. Há mais boa-vontade da parte dos músicos e das pessoas que querem trabalhar do que respeito pelo que se está a fazer. Nenhuma das bandas teria a possibilidade de fazer este CD se não fosse da forma como foi feito, que foi dividindo os custos e a ajuda do Termómetro. A mim custa-me muito ouvir as pessoas a dizer “estão à espera de subsídios?” porque não é à espera de subsídios, a questão é que vais a um lado qualquer fazer um espectáculo e queres ser respeitado e muitas vezes não acontece isso. Há locais bons, poucos; há locais de pessoas competentes que têm um amor enorme pelo que fazem e há muita gente interessante por aí que se calhar nem vai ter a possibilidade de lançar um disco.
    • J.T.: Há uma certa tendência para mudar isso. Fala-se muito das pessoas não gostarem mas há interesse... e aquela conversa de “o que se faz em Portugal não interessa” irrita-me. Irrita-nos a todos!
    • Rodrigo Cardoso (R.C. - Bor Land): A prova que há interesse é que só nesta noite tiveram mais de 200 pessoas aí.
    • J.T.: As pessoas começam a querer ouvir e a querer conhecer.
    • N.S.: Também começam a haver mais espaços e maior divulgação.
    • J.T.: Ainda esta tarde falámos de Seatle e há uns anos atrás não havia absolutamente nada lá e hoje em dia é quase uma Meca. Claro que não queremos fazer de Portugal uma Meca mas vamos tentar criar um circuito de bares para puxar isto para a frente.

  9. Se calhar falta um pouco de entre-ajuda nas bandas...
    • N.S.: Falta um sindicato em relação aos músicos, porque nós não temos protecção em relação a nada. Se o concerto de hoje corresse mal nós teríamos centenas de contos de prejuízo...

  10. Faz falta de programas de televisão para promover novas bandas?
    • N.S.: O que temos (Operação Triunfo e programas do género) são concursos e eu sinto que aquilo engana muita gente. “Estamos a apostar em música portuguesa”, não estão... Estão é a dar roalties, a fazer render os roalties de músicas que já sairam há 5, 10 e 20 anos, com as mesmas pessoas de sempre e não estão a promover música portuguesa. Com o dinheiro que gastam com as pessoas que têm lá, gravam 10 ou 12 bandas boas.


2004 será um ano com diversos lançamentos Bor Land
Estivémos à conversa com Rodrigo Cardoso para conhecer mais a fundo esta editora independente do Porto

  1. Pouco mais de 3 anos Bor Land, 11º disco, pode-se dizer que tem corrido tudo a vosso favor?
    • Tem sido simpático. As coisas têm crescido gradualmente. É um acumular de pedacinhos e agora este é o “pedacinho grande”.

  2. Será este o passo que faltava para colocar os discos Bor Land nas lojas?
    • Se calhar... Agora também temos outros processos de distribuição, como a Internet. Mas a ideia é ir somando pontos para poder ir crescendo.

  3. Novos nomes no catálogo, alguma coisa que já possa ser adiantada? 2004 vai ser um ano recheado?
    • Sim... Logo nos primeiros meses temos previsto o disco de Olga, uma banda de Lisboa; vai sair também Special White Noise, do Porto; The Unplayable Sofa Guitar (Viana do Castelo); The Boy With The Broken Leg, também de Lisboa, da IC Colective; Wave Simulator e depois vai-se vendo.

  4. E compilações?
    • Isso vai sair de certeza. É obrigatório. Não sei bem quando. Queria reformular as compilações que tenho feito, tem de ser algo novo.

  5. As compilações têm sido a melhor forma de chegar ao público?
    • Também... Tem uma margem muito grande que me permite fazer uma grande promoção com as compilações, quer promover a editora, quer diversas bandas de uma só vez, o que permite fazer brincadeiras interessantes.

  6. “Why not you?” é o disco do ano do catálogo Bor Land?
    • Eu não sei. É um bocado difícil para mim gerir a opinião visto que eu estou também dentro do disco. Se fosse a escolher os momentos grandes da Bor Land em 2003 escolheria dois momentos: este disco, pelo trabalho em si, foi um trabalho que demorou 12 meses a concretizar, não foi de um dia para o outro e de relevar também Old Jerusalem, um disco que saiu em Janeiro.

  7. Há um bocado falávamos dos lançamentos para 2004... Também vai haver logo surpresas no início do ano?
    • Fevereiro – Olga, é o primeiro trabalho Bor Land em 2004.

  8. Das bandas com quem já trabalhaste até agora, relançarias todas novamente?
    • Outra vez! E se tivesse de escolher seria Old Jerusalem porque eu gosto mesmo de trabalhar com o Francisco. É simples e eu gosto de artistas que sejam simples, tudo muito objectivo, directo.

  9. Foi esse disco foi o que despertou a crítica e que levou que depois todas as compilações e o “Not the white P?”, que foi o disco anterior ao apresentado esta noite, fossem merecedores de maior visibilidade?
    • Sim, e o “Not the white P?” também tem tido algum destaque. Foi a penúltima edição, estamos ainda a obter resultados (quer para a banda quer para a editora, e eu aqui falo pelos dois) e está a ter o resultado que nós procurávamos na altura que começamos a idealizar o disco. Está a correr como nós planeávamos.


“Vamos continuar a experimentar”
A nossa conversa com Rodrigo, entretanto, direccionou-se mais para o universo Alla Polacca, do qual o editor encarna o papel de guitarrista.
 Alla Polacca no Registus
Alla Polacca no Registus

  1. A meu ver os Alla Polacca têm “jogado à defesa”, digamos assim. Compilações, dois split-CD e só recentemente um EP sem nenhuma outra banda...
    • Porque é um bocado o nosso pensamento... À base de retalhos e de somar coisas. Nós gostamos de fazer esses Splits e de participar nas compilações. Faz parte do “traço” dos Alla Polacca. Só agora é que foi possível lançar um álbum com os Stowaways e é um álbum longa duração e não quisemos mesmo editá-lo sozinhos, queríamos editar com os Stowaways, foi um objectivo. Não iria por aí de “jogar à defesa”, era a forma que nós queríamos para nos expor. Nós conseguimos superar os objectivos iniciais da banda: inicialmente o objectivo era ao fim de dois anos ter um EP; ao fim de 2 anos temos um CD.

  2. Mas é mais fácil apresentar logo 2 ou mais nomes?
    • Eu acho que não. Teria o mesmo ou mais impacto se fosse promoção directa daquele nome. Assim estamos a promover logo dois nomes, é mais difícil gerir as ideias. Nós tínhamos a possibilidade de fazer o disco como um só, não quisemos porque queríamos trabalhar neste formato.

  3. E não há problemas de uma banda ter maior projecção do que outra?
    • No panorama geral, uns gostam de uns, outros gostam de outros. Se gostassem só de um, algo estava mal. As coisas são interessantes porque existe o efeito “arrasto”: se estiverem a promover os Stowaways estão a promover Alla Polacca e vice-versa e é isso que nos leva a fazer isto desta forma.

  4. E ao vivo, também pensam manter essa forma?
    • Depois do de hoje e de amanhã (dia 29/11) ainda não temos marcado mais nenhum mas será sempre com todo o gosto.

  5. Será uma boa forma de promover a música portuguesa, levar 2 ou 3 bandas a um local?
    • Visto que as bandas quando se apresentam por norma é com recurso a singles... Se pensarmos do ponto de vista financeiro e estrutural, as co-edições são o futuro, inclusive em palco, claro.

  6. Alla Polacca, diversos trabalhos, diversos estilos, o que é que se pode esperar?
    • Nos espectáculos começa a haver público diferente porque já começa a haver a curiosidade de ver algo diferente. Vêem um concerto, vêem dois, vêem que foi algo diferente e ganham interesse em ir ver um terceiro concerto. É muito habitual fazermos versões de versões de versões, já nem sei quantas versões de uma música e vamos continuar a experimentar. Não sabemos bem o que vai sair. Temos em mente gravar, ainda não sabemos o que vamos gravar mas não sei sequer se vai seguir estes formatos. Pode ir para coisas mais reduzidas ou para coisas mais completas. Provavelmente vamos trabalhar com outro produtor, já trabalhámos com vários produtores, sobretudo: Inês Lamares com Emanuel Cabral, que gravou o disco de piano, e o Paulo Miranda. Até aí procurámos ser bastante diversos, mas já sabíamos que este disco teria de ser gravado por Paulo Miranda porque a sonoridade que ele tira é muito própria mas não sei como vai ser para o futuro.

  7. As projecções vídeo que já se têm tornado habituais, já são uma preocupação estética da banda de concerto para concerto?
    • Trabalhámos com pessoas diferentes nas projecções e dependem de concerto para concerto, das pessoas que vamos conhecendo e é algo que tentámos conciliar com a música. Usámos isso muitas vezes, às vezes nem está directamente associado ao que estamos a fazer musicalmente. Para este concerto houve a preocupação de associar as imagens ao som.

04/12/2003

Reino Trágico

Os No Doubt editam esta semana uma colectânea que reúne 10 anos de carreira. O disco "The Singles" junta todas as canções escolhidas pela banda california para mostrar 4 discos de originais. Temas clássicos como "Spiderwebs" ou "Just a Girl" fazem parte do lote e também um inédito "It's My Life" (um original dos Talk Talk).

Para além deste "best of" podem também encontrar em algumas lojas a "Boom Box", uma caixa de luxo que junta esta colectânea, um disco de raridades e lados B, um DVD com todos os videoclips e "Live in Tragic Kindom" em DVD. E este é um dos grandes presentes de Natal para quem gosta desta banda tresloucada.

Eu tive a oportunidade de privar com Gwen Stefani e companhia em 2000, se não estou em erro, e mesmo sem ter ficado com a melhor opinião sobre eles como "figuras públicas", como músicos acho-os fantásticos. E felizmente tive a sorte de ter visto o showcase que aconteceu no Paradise Garage só para convidados.

A pergunta que deixo aqui é: para quando um concerto a sério em Portugal ?

Em breve.... Gwen Stefani com um disco a solo... e promete !